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Alma de artista


Então você, leitor, carecerá de cuidados para ouvir músicas acinzentadas, canções murchas e secas como a lua gris? Não! É possível que um disco titulado “gris” seja solar em seus versos e em suas melodias? Sim!
O Gris de Juliana é um fogo vivo, um gris ardente que denuncia a sua alma de artista. Assim, por certo ela se valeu de significados outros para decidir-se por batizar de Gris o seu trabalho.

Produzido por Dante Ozzetti, ele que também escreveu e tocou alguns arranjos, sente-se que o Gris de Juliana Cortes o teve como cúmplice, o que se revela na originalidade do seu trabalho. Sob sua orientação, Arrigo Barnabé, Paulinho Moska e todos os outros músicos arregimentados sacaram a energia a ser dada às músicas.

Impecáveis, tocados por instrumentistas como o próprio Dante Ozzetti (violão e guitarra), Ronaldo Saggiorato e Du Moreira (baixo), Romildo Weingartner (violoncelo) e Guilherme Kastrup (percussão), além de Vina Lacerda (percussão), Rogério Leitum (flugelhorn), Sérgio Albach (clarinete) e Fábio Cardoso (piano), os arranjos têm prazenteiro encanto. Pois neles ouve-se/sente-se, a cada faixa, um time unido em torno do entendimento artístico-musical de Juliana.

O violão de Ozzetti toca a introdução de “Uma Carta Uma Brasa Através” (Vitor Ramil e Paulo Leminski), que abre o disco. A melodia de Ramil é sempre viva, mais ainda quando letrada pelo sempre vivo Leminski. Dobrando a própria voz, tendo a auxiliá-la o violoncelo e o baixo, as notas saem afinadas da garganta de Juliana, como se fossem uma verdade expressa em harmônicas palavras: “Uma carta uma brasa através/ Por dentro do texto/ Nuvem cheia da minha chuva/ Cruza o deserto por mim (...)”.

“O Mal”, música de Dante Ozzetti e Arrigo Barnabé, tem a participação vocal deste. Acompanhada por guitarra, baixo e percussão, tendo ainda um cello e um piano encorpando o arranjo, Juliana, de viva e bela voz, entrega-se às forças advindas de versos certeiros: “Assim, quem jamais pensou no mal/ Floriu, em natureza criminal/ Abriu o seu coração atroz/ Enfim, ele e o mal estavam sós (...)”.

“Balangandãs” (Mauricio Pereira) tem letra que, propositalmente, parece não caber na melodia, o que pede balanço à intérprete – predicado que ela tem de sobra.

Juliana Cortes! Sua voz, linda, soa por vezes intimista, mas sempre emoldurando o canto com sincera emoção. Ainda que viscerais, suas interpretações vêm carregadas de sonhos fraternos. Suas divisões rítmicas têm suingue; suingue brotado na diversidade musical que o Brasil e a América do Sul têm e demostram em suas folganças.

Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4