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Arrebatamento literário


Foi a maternidade que levou a antropóloga Wednesday Martin a retomar sua observação  acadêmica de um tipo específico de mulher: as mães economicamente abastadas que vivem no Upper East Side, em Nova York. Ao se mudar com o marido e o filho pequeno para a região, ela, que pretendia apenas morar perto do colégio do menino, descobre a hostilidade das outras mulheres e, usando seus conhecimentos de primatologia, cria um paralelo daquele grupo com os babuínos. O sarcástico Primatas da Park Avenue (Intrínseca, R$ 39,90) desvenda um pouco do universo dessas donas de casa que cursaram universidades de prestígio, mas que deixaram de lado carreiras ao se casarem com homens poderosos. O acordo é que gerenciem a família como uma empresa, levando os filhos a serem aceitos em boas instituições de ensino – o que rende a elas mesadas altas, o que, para algumas, é correspondente ao alcance de metas.  Não deixa de ser intrigante e parecer ficção, mas a autora garante que é a realidade. A socióloga britânica Catherine Hakim corrobora essa tese em Capital Erótico (BestBusiness, R$ 49,90), que, lançado  há alguns anos, provocou a ira das feministas ao afirmar que muitas mulheres buscavam a segurança financeira no casamento, dedicando-se à família como a uma atividade profissional.


Pular de um gênero a outro até encarnar numa gatinha dorminhoca é um exercício fascinante que o jornalista Elias Fajardo oferece ao leitor em Belo como um abismo (7letras, R$ 29). É através de Emily, a gata, que conhecemos a história de suas xarás, a romancista inglesa Emily Brönte e a poeta americana Emily Dickison. Otávio bebe no Baixo Gávea, viajando, ao mesmo tempo, pela Índia, enquanto sua filha Clara, que jamais nasceu, surge ao longo da narrativa. Sonhos se entranham na realidade, que derruba as barreiras do imaginário neste romance arrebatador, finalista do Prêmio Jabuti deste ano.


Arrebatadoras também são as imagens do Rio de Janeiro vistas através das lentes de Custódio Coimbra, fotojornalista que se especializou em registrar o cotidiano da cidade e de seus habitantes. Uma pequena mostra das belezas e agruras captadas por este carioca que até hoje costuma rodar a cidade em busca de notícias está em Rio de Cantos 1000 (Reptil, R$ 99). Montanhas cobertas de vegetação cerrada se impõem aos edifícios que se aglomeram em frente a praias, a arquitetura colonial que sobe morros, mangues, foliões no Carnaval, barracas colorindo as areias à beira mar, bondes cortando Santa Teresa, pedestres chapinhando na chuva sobre as pedras portuguesas, o concreto empurrando a natureza, a espuma das águas poluídas da Baía de Guanabara estão em fotografias que reproduzem o calor da tão cantada São Sebastião do Rio de Janeiro. Inebriante.