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Celebrações em torno do livro


A Bienal do Livro carioca acontece no Riocentro, e há que se espante com a ausência de leitores contumazes da feira. Nem todo mundo se anima a enfrentar o trânsito e a distância considerável entre o Riocentro e o restante do planeta para ouvir multidões de pré-adolescentes gritando por seus autores favoritos. A Bienal é uma festa para acostumar o visitante à presença do livro no cotidiano, tietando escritores, com o entusiasmo característico de uma celebração carioca.


Quem tem na leitura sua principal forma de lazer/escapismo/oxigenação de ideias mantém convivência rotineira com os livros. Mas a Bienal é importante para a formação de leitores como o advogado paulistano Pedro Pacífico, que credita à leitura um papel crucial na construção de sua identidade, como conta em Trinta segundos sem pensar no medo – Memórias de um leitor (Intrínseca, R$ 49,90). Pedro se fez leitor sem influências externas. Os pais não liam, as avós, sim. Na infância, aconteceu o encontro com as aventuras de Harry Potter. Nunca mais parou de ler e tornou-se um influenciador de leituras, criando o pseudônimo Bookster para indicar livros em curtas resenhas publicadas na Internet.

Ao desfiar a importância do que leu para refletir sobre diferentes etapas de sua vida, Pedro deixa de lado considerações a respeito da estética para falar do quanto uma leitura teve importância em algum momento específico. O livro traz prazer, consolo, revelação, seja em um clássico, em uma peça de autoajuda ou em um best-seller. A simplicidade e o tom sincero de suas resenhas lhe garantiram 450 mil seguidores no Instagram no perfil @book.ster.

Dissecar informalmente a alma do leitor é uma especialidade de Shaun Bythell, que desfia sua rotina por um ano em O diário de um livreiro (Principis, R$ 53,60). Há duas décadas, ele comprou “a segunda maior livraria de livros de segunda mão da Escócia”. Não é um sebo qualquer. The Book Shop, na cidade de Wigtown, tem um acervo de 100 mil volumes e compradores analisados cruamente pelo livreiro. Wigtown é uma book town, um conceito criado em 1988, quando a cidade galesa de Hays-on-Wye, promoveu seu primeiro festival, atraindo milhares de visitantes. As book towns são cidadezinhas com vários sebos e livrarias, com eventos que incentivam o turismo bibliófilo. Hoje, há festivais mundo afora, como no Brasil, desde a primeira Festa Literária de Paraty (Flip), no início dos anos 2000, que inspirou dezenas de outras localidades a criarem suas feiras de livros. Shaun Blythell é um dos organizadores do festival em sua cidade.


Mais erudito, porém nada menos apaixonado por leitura era o editor italiano Roberto Calasso (1941-2021), que, em Como organizar uma biblioteca (Companhia das Letras, R$ 36,90), passa da ordenação dos livros para a liberdade de manuseá-los, rabiscando e gravando impressões ao longo da leitura. Para Calasso, o bibliófilo que “nem sequer ousa cortar páginas para não lesar a integridade de um livro “é o contrário de um verdadeiro leitor”. O texto, originalmente um discurso de Calasso, trata do amor pela leitura salpicando observações deliciosas, como a inconveniência da obrigatoriedade de ler os livros em voga no momento. Para Calasso, o leitor verdadeiro “está sempre lendo um livro — ou dois ou três ou dez — e a novidade chega como um incômodo ... no interior daquela atividade ininterrupta