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Danadodebom, sô!


O disco vai muito além de onde costuma ir um álbum comum. Contém uma arrebatada declaração de amor a Minas Gerais: além de dez músicas, onze textos de Fernando Brant entremeiam-se às faixas (pena não constarem do encarte).

Fernando não poupa palavras, encadeadas de forma tão poética que temos a impressão de estar diante de um palco, assistindo a um musical. Os textos são recitados pelo próprio Fernando – o narrador da trama –, e as músicas, interpretadas por Mariana, com o acompanhamento do piano de Kiko Continentino e do violão de Geraldo Vianna. Mas o repertório do CD é que é sobretudo o máximo.

Ao ouvirmos a boa cantora que é Mariana Brant, fica claro como ela é a intérprete adequada para cantar o jeitinho mineiro de ser na visão de dois grandes compositores. Mesmo que em alguns momentos demonstre um quê de insegurança, sua voz navega afinada, doce e mineiramente.

As harmonias de Geraldo Vianna possibilitam que as melodias desdobrem-se em grande quantidade de notas, fazendo com que tenham intervalos de difícil execução.

Para Mariana Brant, isso não é nenhum atropelo. As letras de Fernando Brant têm a marca registrada de um grande letrista, um poeta que cria belezas raras. Pudera: ele é um tradutor fiel da música mineira, que tem no Clube da Esquina uma porta aberta ao mundo.

Até mesmo um tema instrumental como Falso Chorinho, composto por Geraldo Vianna em homenagem a Thiago Viana, encaixa-se à perfeição no contexto da louvação às Minas Gerais.

O mesmo ocorre com Pavane, de Gabriel Fauré, que ganhou letra de Fernando Brant. Em nove das dez faixas, o violão se une ao piano para clarear o sentimento do poeta. Em uma delas, A Travessia, temos ainda um naipe de quatro violinos, duas violas e um violoncelo que, graças ao arranjo de Geraldo Vianna, fazem crescer a dramaticidade dos versos: Quem me feriu/ Quem matou em mim/ O que eu sei/ O que eu pensei?/ Eu era rei/ Não serei mais/ Minha terra, meu adeus/ Poder de Deus, adeus (...).

Após um passeio pela alma mineira, o final do disco é exuberante. Um texto dito por Fernando Brant desvenda Minas ainda mais, tendo o violão como suporte. Violão que, findas as palavras, toca a introdução da canção final. Violão que, agora, tem respaldo na percussão do tambor e revela uma música belíssima, plena de emoção, cuja melodia é, sem dúvida, a mais bonita de todo o disco.

Ouvindo o álbum, dá até para visualizar uma casa de fazenda: janelões abertos, o cheirinho do café coado no fogão à lenha e do pão de queijo quentinho invadindo a cena, violão e piano tocando, uma voz feminina cantando... Lá longe o trem apitando. E a lua, até mesmo ela, aguçando os ouvidos para melhor saber de Minas e seus gerais.

Aquiles Rique Reis