Loading...

Derrubando os tsundokus


No alto da colina de livros na minha mesa de cabeceira está “Nas sombras do Estado Islâmico – Confissões de uma arrependida” (Best-Seller, R$ 29,90), o eletrizante relato da assistente social congolesa Sophie Kisiki, que deixou o marido na França para trabalhar como voluntária na Síria, levando o filho de quatro anos. Depois de três meses, Sophie conseguiu fugir de volta para a Europa, onde foi processada e presa pelo rapto do menino.  Atualmente, 35% das pessoas que deixam a França para juntar-se aos jihadistas são mulheres.

O acerto de contas de uma mãe – A vida após a tragédia de Columbine” (Verus, R$ 39,90) é o doloroso depoimento de Sue Klebold, mãe de um dos jovens que assassinaram treze pessoas e feriram 24, antes de se suicidarem, na escola de Columbine, numa cidade do estado norte-americano do Oregon. É inevitável recordar “Precisamos falar sobre o Kevin” (Intrínseca, R$ 34,90), de Lionel Schriber, que dá voz à fictícia mãe de um garoto responsável pela chacina de colegas do colégio. Mas as conclusões sobre a sociopatia de Kevin não podem ser comparadas ao horror da realidade enfrentada por uma família carinhosa e preocupada com o bem-estar de seus membros.

Uma educação que privilegie a autonomia das crianças é o que recomenda a professora universitária Julie Lythcott-Haims em “Como criar um adulto – Liberte-se da armadilha da superproteção e prepare seu filho para o sucesso”  (Rocco, R$  49,50). Sempre que pego o livro, dou uma lida em um bom trecho, mas acabo devolvendo para a mesa de cabeceira. Isso porque o texto está um tanto distante da realidade das grandes cidades brasileiras da atualidade. Julie, que vive na Califórnia, escreve para um público de classe média que mora nos subúrbios norte-americanos, europeus, canadenses, australianos e, talvez, nas metrópoles escandinavas. Ela defende que a imaturidade dos jovens adultos atualmente se deve à infância e adolescência superprotegidas, com pais controlando os filhos por celular e servindo de motoristas para trajetos entre escola e casa. Por mais que eu concorde que joelho ralado cicatriza, penso nas nossas crianças alvejadas por balas perdidas, mesmo quando estão brincando nos quintais, ou assaltadas a caminho dos colégios.

Alguns tsundokus pulam a fila e são devorados antes até dos que estão na etapa de leituras compartilhadas. Um desses foi “Como viajar sozinho em tempos de crise financeira e existencial” (Record, R$ 22,90), do jornalista Hermés Galvão. Na terceira folheada, o divertidíssimo texto agarra o leitor, com as dicas e críticas à experiência do viajante moderno planeta afora. Interrogatórios policiais, como lidar com a tripulação das aeronaves (jogue charme e consiga um tratamento VIP), o que levar na bagagem (pouca roupa e só), o que evitar em qualquer local do mundo (crianças, adolescentes e grupos de brasileiros), onde fazer boas refeições, o melhor horário para entrar em museus são tratados com tanto humor que boa parte das recomendações se perde em meio às gargalhadas de quem lê.