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Em seu novo CD, Julio Dain está ainda mais desabusado


Em seu segundo disco, Dain está ainda mais veemente. A manha para criar melodias audaciosamente elaboradas aguçou-se; a busca por palavras que comporão versos igualmente diferenciados acentuou-se. E a música de Julio soa como um sopro de vitalidade ainda mais marcante. Álbum que, com a unidade característica dos que têm claro o sentido da expressão, alastra amplitudes, Apenas Humano é a imagem de um jovem talentoso que sabe que sabe ir além no desempenho do seu ofício. “Bom Élevè” (Julio Dain) abre e dá o tom do álbum. A longa e fecunda letra teve como ponto de partida a frase dita ao autor pela musa de uma de suas músicas: “A vanguarda hoje é meio démodé”. Tudo a ver. Em sua interpretação, nessa como em outras faixas, Julio é performático. Seja cantando ou tocando, ele nunca teme expor-se, muito menos recusa experimentações de qualquer ordem, sejam elas estéticas ou conceituais – não fosse ele filho do grande compositor Renato Rocha.No piano, no teclado, no Fender Rhodes ou na guitarra, com voz que se fortalece nos graves, acentua-se na região intermediária e esforça-se nos agudos, Dain está sempre pronto para desafiar seu vasto limite.Os arranjos de Bia Paes Leme, Marcelo Caldi, Paulo Malaguti, Henrique Band, Antonio Saraiva e do próprio Dain são tudo do que as composições precisam para assumir seu ar cada vez mais excitante e, a cada compasso, a cada sílaba, ser mais atual.Contando com atuações inventivas, fruto do talento de Lui Coimbra (cello), Marcos Suzano (percussão), Mário Seve (flautas e pífano), Roberto Marques (trombone), Sérgio Reze (bateria), Marcelo Costa (bateria), Pedro Sá (guitarra), Edu Morelenbaum (clarinete e clarone), do grupo vocal Folia de 3 (Marianna Leporace, Eliane Tassis e Cacala Carvalho), dentre outros, cada acorde soa impregnado pelo ardente e profano desejo de seduzir. O sumo do que é o instrumentista, cantor e compositor Julio Dain está em “Saliêncio”. A simplicidade desta música, cheia de veredas e desvios, causa espanto em quem a ouve. E, mais uma vez, faz sobressair a vocação performática de Julio, em apenas quatro versos – e para que mais!? Piano e baixo dão início à introdução, que desemboca numa pujante levada. A voz é grave, é profunda. Tudo como um mantra. No intermezzo, clarinetes, oboé e fagote; a bateria os transporta de novo para a levada rítmica. Esplêndido!“Morcegos”, apenas com guitarra e a voz reverberando, é nova fonte de deslumbramento, com seus poucos versos: “Como o amor/Cegos/Como um nó/Cego/ Como dois mor-/Cegos/Dançávamos na noite”. Apenas Humano é isso e mais: ouvir o som de Julio Dain é como se deixar levar por um instante de euforia em que tudo na vida parece, enfim, fazer sentido.Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4