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HISTÓRIAS MIÚDAS


Geladeira velha, fogão velho, máquina de lavar, rádio, enceradeira, chumbo, cobre... O moço ia passando e alardeando na caminhonete tão velha quanto os objetos que comprava.

E o pior: repetindo, repetindo, repetindo com aquela voz que não se afasta nunca mais dos nossos ouvidos, pastosa, mal lubrificada que nem as enceradeiras velhas, invadindo os prédios pelas janelas, acordando a rua com o eco do chumbo:


"Chame o moço que o moço volta!"


Sou segurança noturno, disse que um dia ainda faria uma desgraça, chego em casa no meio da madrugada, muitas vezes pedi a Deus que não me permitisse a tentação da desgraça, vou me deitar o dia quase clareando, antes das sete a geladeira, a máquina de lavar e o rádio que não toca mais já estão chamando para cometer uma desgraça, esticando a corda.


Na terceira vez que ouvi "O moço vol..." eu já estava com a espingarda engatilhada, afinando a pontaria entre as frestas da janela e disparando em direção ao som, a frase infeliz sendo interrompida, tendo certeza de que o moço não volta porque vi sua cabeça pender sobre o volante e a caminhonete se arrastar para cima do poste.


Uma desgraça.