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João de Barro morreu feito um passarinho


Aplausos para Braguinha. Medalhas para João de Barro. Prêmios para o cidadão Carlos Alberto Ferreira Braga. Tudo que lhe for concedido será, ainda assim, pouco. Um talento popular e direto como o desse compositor não se encontra, infelizmente, ali no festival da esquina.O grande prêmio a ser oferecido a esse homem é a oportunidade para que ele seja (re) conhecido pelos habitantes desta nação. Propiciar a brasileiros e brasileiras de todas as idades a chance de ouvir "As Pastorinhas"; "Touradas em Madri"; "Carinhoso"; "Copacabana"; "Balancê"; "Pirata da Perna de Pau"; "Chiquita Bacana" e "Anda Luzia" seria como uma comenda de amor. Uma homenagem a nós mesmos, um louvor à nossa capacidade de gerar e reverenciar pessoas da altura do "passarinho" João de Barro. Seria bom fazer com que a obra dele fosse ligada a seu nome e à sua imagem. Legal seria dar representação ao som que alegrou, embelezou, e ainda há de embelezar, alegrar e enriquecer a vida de muitos de nós.Seus maiores sucessos são as marchinhas de carnaval. O samba-canção e a toada foram, também, alguns dos gêneros musicais com que Braguinha encantou platéias. "Fim de Semana em Paquetá" e "A Saudade Mata a Gente" fazem parte do que existe de melhor na música popular brasileira. Obra plural, de forte apelo popular. Obra diversificada, com a chancela da riqueza da música mais bela desse planeta. Obra de João de Barro, um brasileiro. Como se não bastasse todo o repertório assinalado até aqui, garanto-lhes que o melhor ainda não foi dito: a grande genialidade de Braguinha materializa-se em sua obra infantil. Foram mais de cinqüenta discos com histórias encantadoras. Todo brasileiro deve conhecer: "(...) Quem quer casar com a senhora Baratinha/ Que tem fita no cabelo e dinheiro na caixinha?". Ou ainda: "Nós somos os caçadores/ E nada nos amedronta (...)" E a menininha que ia solitária pela estrada "(...) levar esse doce para a vovozinha" São momentos musicais inspirados, concedidos àqueles que tiveram a chance de usufruir dos lampejos da criatividade voltada para o entretenimento de toda uma geração de crianças e seus pais, principalmente aquelas mães e pais que sonham com uma cultura infantil diferente daquela oferecida pelas TVs ao longo de manhãs e tardes vazias.Mas naquele domingo cinza, véspera do Natal, a voz de Braguinha silenciou para sempre. Ao menos para nós, que continuaremos aqui neste círculo de vida, a voz de João barro não mais será ouvida. Parece ironia de um destino que às vezes teima em se fazer de insensível, mas levá-lo agora foi como nos presentear com o futuro às avessas. Criança alguma, adulto nenhum, merecia perder a voz desse passarinho que tanto falava à alma infantil - posto que a traduz - justamente no Natal.Aos 99 anos de vida, morto o poeta das crianças, sua obra continuará a cantar por ele. Vida e morte em comunhão difícil de admitir, complicada de entender, mas clara em seus efeitos revelados em olhos afogados por lágrimas que tristemente escorrerão por todo o ano novo que será muito mais triste, já que se apresentará sem a presença física de Carlos Alberto Ferreira Braga, para sempre Braguinha.E quando o carnaval chegar, a colombina, abraçada a seu pierrô embriagado, entoará um canto de louvor a João de Barro. A letra alegre da marchinha lembrará aquele que se foi sem que necessariamente o tenhamos perdido.Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4 e autor de O Gogó de Aquiles, ed. A Girafa. Seus textos são publicados semanalmente no Acontece na  no Diário do Comércio (ACSP), Meio Norte (Teresina), A Gazeta (Cuiabá), Jornal da Cidade (Poços de Caldas) e Brazilian Voice (EUA). No rádio, sempre às segundas-feiras, das 15h às 16h, "O Gogo de Aquiles" vai muito bem, obrigado. Você poderá escutá-lo (no Rio de Janeiro) sintonizando diretamente na Rádio Roquete Pinto, ou (fora do Rio) na internet: www.fm94.rj.gov.br .