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Músicos pelo prazer de tocar juntos


Tal tentativa já redundou em muita salada de sons próxima de uma cilada, na qual o resultado se tornou um misto de exagero com desperdício. Entretanto, Daniel fez de Sertão Negro (Organismo Vivo) - quinto CD deste instrumentista, compositor e cantor paulistano - uma reunião de aptidões que se aderiram, multiplicando-se. Todos instigados pela vontade de criar algo fora dos parâmetros percebidos em ajuntamentos ocasionais, nos quais os músicos, ainda que individualmente virtuosos, não chegam a formar um time afinado com o intuito primeiro de quem que os recrutou. Além de tornar perene a sua competência musical, Daniel Taubkin revela um forte poder de criar belezas a partir de combinações sonoras expressivamente diversificadas. A variação no uso dos instrumentos, bem como as diferentes formações de trios e quartetos, revela um estimulante resultado. Ora brando e leve; ora intenso e vigoroso, o som de Sertão Negro nunca é previsível. Há sempre uma boa surpresa a cada acorde, a cada compasso melódico. As letras se adéquam às divisões rítmicas, formando um conjunto harmonioso que se reflete em cada uma das 15 faixas do CD - grande parte de autoria de Daniel, algumas em parceria.Uma intensa sensibilidade musical aflora de cada um dos arranjos. Neles reside boa parte da riqueza do conjunto da obra capitaneada por DT. Trabalho coletivo de um seleto grupo que se imbuiu do espírito de que, para melhor e mais bonito fluir, a técnica individual deve ser aliada ao prazer que vem do escutar, o que resulta em um exercício de humildade. E com isso se comprazer.As cordas da orquestra Tom Jobim (regência de Roberto Sion) se juntam ao piano e a flauta para, líricos, arrebatarem a emoção numa bela canção: "Caprichos", versos de Fagundes Varela e Castro Alves musicados e cantados calorosamente por Taubkin.As palmas ditam o ritmo, os timbales o ampliam. O piano dedilha notas de um samba. A flauta percebe e se junta a ele. O ritmo aguarda sua vez. E ela vem com o violão e uma leve percussão. Vozes distintas se revezam. O pandeiro, a cuíca e mais o prato da bateria ajudam as vozes a levarem "Tem Mais Samba" (Chico Buarque).Dorival Caymmi fez "O Dengo Que a Nega Tem", que começa com Daniel acompanhado por violão e pandeiro e finda com referência a Clementina de Jesus. Os metais são quentes. O violão suinga. A percussão dita a levada. O piano e a flauta se completam. O coro canta a melodia, intercalando a função com a voz de DT, às vezes amparando-a e fortalecendo-a, noutras, abrindo acordes. O tamborim ressoa. A voz sola. O piano e o violão se achegam. Metais, cordas e baixo caminham juntos... Em Sertão Negro tem também choro, rap, valsa, cantiga... Tem o frescor da sonoridade da música brasileira sacudindo a mesmice.Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4