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O Brasil de Gnattali


Suas harmonias se destacavam. Seu sentido de traduzir brasilidade em notas e acordes surpreendia. Camerístico, erudito, popular, ele é a verdadeira escola da pluralidade musical na qual outros grandes músicos se inspiram. Profícuo criador, Gnattali deixou-nos um legado de obras-primas.Seu quinteto foi responsável por alguns dos melhores momentos desse pianista e compositor. Para integrar o Radamés Gnattali Quinteto, o mestre buscou, logo de cara, o baterista Luciano Perrone e o contrabaixista Pedro Vidal. Era o início dos anos 1930. Depois foi a vez de Zé Menezes, com seu violão e sua guitarra, integrar-se ao grupo e formar um quarteto. Mas foi com a chegada de Chiquinho do Acordeom, em 1953, que nasceu o lendário Radamés Gnattali Quinteto. O grupo tocava os arranjos, recheados da sensibilidade musical brasileira, escritos para as composições de seu líder. Mas não era só a elas que ele dedicava orquestrações cada vez mais bem sofisticadas e contundentes. Radamés especializou-se em também traduzir, com sua visão modernista, as músicas de outros grandes mestres. Para sossego da memória musical brasileira, todas as partituras de sua autoria ficaram sob a responsabilidade de Chiquinho do Acordeom. Até que, em 1993, este repassou o tesouro que lhe coube cuidar para Henrique Cazes. Estudioso e admirador da obra de Radamés, Cazes passou a imaginar a melhor maneira de trazer novamente à luz aquilo que tanto encantara os que tiveram a regalia de ouvir. Em 2000, com outros quatro músicos, tão virtuosos e competentes quanto ele, dedicou-se à tarefa de reeditar a formação original do Radamés Gnattali Quinteto. A Cazes e sua guitarra (ele nunca ficaria de fora de uma roda dessa, claro!) juntaram-se a pianista Maria Teresa Madeira, o acordeonista Marcos Nimrichter, o contrabaixista Omar Cavalheiro e o baterista Oscar Bolão. Estava formado o quinteto que tem como objetivo, em pleno século 21, tocar os arranjos originais de Radamés Gnattali exatamente como eles foram concebidos há mais de 50 anos. Nascia assim o magnífico CD Radamés Gnattali – Novo Quinteto (Rob Digital). Obra de referência, o álbum traz oito composições de Radamés, duas de Jacob do Bandolim e duas de Pixinguinha. Seguindo fielmente as partituras deixadas pelo mestre, o Novo Quinteto brilha intensamente ao reproduzir com vivaz autoridade o som que marcou uma época. A sensibilidade dos cinco instrumentistas – todos craques, todos jovens maduros em seus ofícios –, permitiu que transparecesse uma reverente humildade para tocar exatamente o que há na partitura de cada obra orquestrada por Radamés.É arrepiante imaginar que os ouvintes das 12 faixas do CD, se não souberem que ali estão os arranjos originais, escritos em meados do século passado, poderão pensar que o Novo Quinteto criou arranjos modernos para músicas antigas. Não! Os músicos ali tocam com prazer latente na alma para reverenciar exatamente a contemporaneidade de quem criou tanta beleza em música.Radamés foi um mestre na arte de escrever para piano. Os solos, e não só os do seu instrumento, são singulares. Quase sempre seguidos de duos e trios com linhas melódicas abertas, os arranjos de Gnattali representam, ainda hoje, um avanço em direção à perfeição dos instrumentistas brasileiros – eles, que tocam a diversidade; eles, que representam a excelência sonora da melhor música do mundo. Graças a Radamés, e aí está o Novo Quinteto para comprovar, a modernidade continua a perpetuar o som que vem do Brasil de Gnattali.Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4 e autor de O Gogó de Aquiles, ed. A Girafa. Seus textos são publicados semanalmente no Acontece na  no Diário do Comércio (ACSP), Meio Norte (Teresina), A Gazeta (Cuiabá), Jornal da Cidade (Poços de Caldas) e Brazilian Voice (EUA). No rádio, sempre às segundas-feiras, das 15h às 16h, "O Gogó de Aquiles" vai muito bem, obrigado. Você poderá escutá-lo (no Rio de Janeiro) sintonizando diretamente na Rádio Roquete Pinto, ou (fora do Rio) na internet: www.fm94.rj.gov.br .