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O espelho de Diogo Nogueira


Firmou em sua alma a vivência que arrebata os que não têm mais escolha, pois o samba chamou e nada resta se não obedecer ao chamamento. Doce convite àquele que, antes de tudo e de todos, sentiu que nele estava o mapa, que ali estava traçado o caminho a ser seguido.Diogo Nogueira foi. Firmou seu ponto, encorpou seu canto e se fez sambista. Seu pai, com os olhos cheios de amores e lágrimas, ao apontá-lo aos velhos companheiros reunidos em volta de uma mesa com tampo de mármore e pés de ferro trabalhado, entre moelas e tremoços, cervejas geladas e rabos-de-galo, lá em cima, marca o ritmo na palma da mão.Era o início de julho de 2007 quando Diogo pisou o palco do Teatro João Caetano no Rio de Janeiro. Com direção de Ginaldo de Souza, dois shows estavam marcados. Dali sairia um CD gravado ao vivo. Subiram ao palco com ele Alceu Maia (cavaquinho), André Neiva (baixo), Camilo Mariano (bateria), Marcelo Nami (violão de sete cordas), Wallace Peres (violão de seis cordas), Dirceu Leite (sopros), Fernando Merlino (teclado), Marçalzinho, Marcelo Pizzott e Pirulito (percussão), Paulinho da Aba (pandeiro), Analimar Ventapane e Jussara Lourenço (coro). E havia também três convidados especiais: Marcelo D2, Xande de Pilares e Marcel Powell.Eis que Diogo chega à praça com seu Diogo Nogueira ao vivo (EMI). Com produção de Alceu Maia, que fez arranjos para 11 das 14 músicas do CD – as outras três tiveram arranjos de Ivan Paulo –, o CD se vale principalmente da cozinha rítmica para acentuar a cadência dos sambas cantados por Diogo. O teclado de Merlino é sutil como deve ser um instrumento que, em excesso, se torna um estranho no ninho do samba. Os sopros de Dirceu são eficientes e criam momentos distintos para cada faixa que interpretam. A batera de Camilo é pulsante e permite que a levada seja preenchida pelos instrumentos de ritmo que dão mais gosto aos arranjos.“Poder da Criação” (João Nogueira e Paulo César Pinheiro) abre o disco e causa arrepio. A semelhança do cantar do filho com o do pai é emocionante. E a roda de samba segue com um show de interpretação de Diogo. Vem outra parceria de João e Paulinho Pinheiro (“Batendo a Porta”). Firmado, lá vai o samba com Diogo e Marcelo D2 que cantam “Nó na Madeira” (João Nogueira e Eugênio Monteiro). Show de bola. O coro come, a galera responde em delírio, ao som que os dois tiram do samba tradicional. Logo chega Xande de Pilares para mandar “Cai no Samba” (Ciraninho) junto com Diogo. Ciraninho é parceiro de Diogo em “Laço Desfeito” e em “Trem do Tempo”, esta também com Alceu Maia. Um violão febril abre a faixa 12, “Violão Vadio” (Baden e Paulo César Pinheiro). É Marcel Powell. Melodia difícil, para a qual Diogo talvez devesse ter dado um pouco mais de atenção na emissão dos graves e, principalmente, na respiração, ou na falta dela, que faz com que ele respire no meio de uma palavra. Diogo ainda canta, dentre outras, “Samba Pros Poetas” (dele e Inácio Rios) e a obra-prima de Nelson Rufino, “Vazio – Está Faltando Uma Coisa em Mim”. Voz firme de veterano; o repertório é de extremo bom-gosto; o suingue de sambista salta aos ouvidos; as divisões rítmicas evidenciam o estilo deste moço cantor talhado para o ofício. Grande intérprete, Diogo é um compositor em formação. Mas sua trajetória tem um espelho a seguir e seguirá, posto que o samba se lê na raça daqueles cantores que já nascem criado para a façanha. Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4, é produtor e apresentador do programa O Gogó de Aquiles, apresentado na Rádio Roquete Pinto FM do Rio de Janeiro às segundas-feiras, das 15h às 16h: www.fm94.rj.gov.br