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O poeta cantador de loucas ficções


Roney é também arranjador, cujo grande mérito foi dar asas à inventividade e à sensibilidade de Mario Manga (violoncelo) e de Alexandre Ribeiro (clarinete), que juntos dão amplitude às intenções dos versos e aos intervalos melódicos de onze das dezoito músicas do álbum. Some-se a eles o baixo acústico de Maurício Biazzi e temos uma trinca com enormes recursos, a dar requinte à perspectiva musical desejada pelo autor. Liberdade e criatividade das quais também se valem Toninho Ferragutti e seu acordeom para um espetáculo de rara competência.Cantor de recursos limitados, sua voz dá conta de revelar imagens e conceitos criados pelo versejador. E a força de sua música vem justamente das palavras que soam como que vindas da imensidão de um delírio, como que fugidas das profundezas do que restou para ainda ser dito. Suas letras são ora leves, ora estranhas; ora dolentes, ora incandescentes; ora diretas, ora metafóricas... Imprevistas.Valendo-se do que hoje se rotula como chamber pop (música pop de câmera), na qual a melodia funciona quase como um pano de fundo que busca sonorizar a intenção de cada verso, o cantar resulta num "falar melodioso", como se todos estivessem a serviço de refletir o pensamento do letrista. E é aí que brilha, reafirmo sem temor de ser redundante, o talento do Roney Giah arranjador: violão de sete cordas, baixo acústico e piano Fender Rodhes (Nado Silva e Piu) seguram a onda da harmonia e das levadas, permitindo ao clarinete e ao clarone de Alexandre Ribeiro, ao acordeom de Toninho Ferragutti e ao violoncelo de Mario Manga ficarem liberados para flutuar em múltiplos improvisos, com os mais inspirados desenhos melódicos.  "Estamos Seguros Debaixo do Meu Cobertor", a primeira faixa do CD, começa com o baixo marcando o ritmo. O clarinete dá sinal de vida. Giah inicia o canto. O piano se ajunta ao cello. Logo a voz de Dandara Modesto se junta à de Roney para cantar o refrão que repete o título da música."Ícaro" tem letra que diz: "(...) Parecia ser tão certo, era o sonho ser feliz ou chegar perto/ E ter apenas um motivo pra acordar e desejar a paz/ Mas múltiplos enganos no decorrer da história/ Eu acho tão humano duvidar da vitória/ Conquistas e derrotas são como o mar e a gaivota (...)". O clarinete boia sobre as águas do canto e da letra. Junto com o violão de sete, o baixo elétrico marca, lembrando as canções folk norte-americanas.   Feito Ícaro, como um argonauta atarantado, as palavras conclusivas de Roney Giah se confundem com as inconclusivas, abrindo espaço para o absurdo e para a incoerência, tudo findando em músicas cativantes. Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4