Loading...

Samba na veia


São 13 cordas de dois violões, mais as cordas vocais de Dorina, tudo para dar ao samba um novo jeito de balançar. E aí está o segredo deste trabalho: mostrar que não há limite para fazer do samba algo até então insuspeitável.O samba é música em aberto. Assim, cabe sempre um jeito novo para mostrá-lo; há sempre uma boa surpresa esperando para tocá-lo num acorde perfeito maior, ou numa dissonância. O tocar samba definitivo ainda está para ser descoberto – talvez nunca se chegue a isso. Mil e uma formas de fazê-lo ainda estão para ser trazidas à luz do tocar e do cantar. Cabe aos sambistas de ofício, ou aos sambistas de ocasião (tudo certo, desde que bambas) partirem para dentro do repertório disponível e consolidá-lo, cada qual a seu jeito e formosura, como a manifestação musical mais próxima da alma brasileira.   E foi exatamente o que realizaram Dorina, Cláudio Jorge e Carlinhos Sete Cordas. Partindo de uma boa idéia, demonstraram que samba é samba, independentemente do ritmo que o acompanhe. O suingue deste tipo de música nasce com quem o cria. A ginga dele tem em qualquer instrumento o seu digno representante. Mas o violão é quem, junto com o cavaquinho, dentre todos, pode representá-lo; pois está para o samba como para este está o surdo. E cada qual tem seu justo valor. Juntos ou separados, cabe a quem os toca dar o brilho que o samba precisa para traduzir o que sente a gente brasileira.Justamente por isso o trio correu atrás de músicas que têm o violão como tema. E tome Nei Lopes, Martinho da Vila, Moacyr Luz, Luis Carlos da Vila, Cartola, Candeia, Dorina, Cláudio Jorge, Carlinhos Sete Cordas, Arlindo Cruz, Sombrinha, Bide e Marçal na veia. Sambas conhecidos, entre outros nem tanto, compõem o repertório dessa formação até aqui “inusitada” de tocar samba: “Violão Vadio”, clássico de Baden Powell e Paulo César Pinheiro, tem em Dorina uma intérprete que lhe dá ares ainda mais puros. O solo do violão de seis cordas de Cláudio é tão delicado quanto límpida é a voz de Dorina e precioso é o fraseado criado por Carlinhos para seu sete cordas. Em “Tudo se Transformou”, após um começo sem definição rítmica em que os violões contraponteiam em sintonia absoluta, permitindo a Dorina revelar a beleza da melodia composta por Paulinho da Viola, os três se dão ao ritmo com a eficiência de quem tem toda uma bateria a ampará-los. Estão sós, mas têm o germe do ritmo nas veias. “Cordas de Aço”, de Cartola, é samba lento, conduzido na ponta dos dedos por Cláudio até encontrar companhia nas sete cordas de Carlinhos.  Em “Meu Violão”, os violões tocam a introdução e marcam o ritmo. Dorina canta com emoção o samba-choro pouco conhecido de Sidney Miller. E tem ainda um dos primeiros sambas de Chico Buarque, “Amanhã, Ninguém Sabe”... Assim sobressai-se a capacidade do trio de intérpretes de O Violão e o Samba: criar dinâmicas próprias, com nuances de fraco e forte, sem que seja obrigatoriamente necessária a presença da cozinha rítmica. Dorina é perfeita para dar ao samba um novo jeitinho de cantá-lo sem que sintamos falta do surdo. Cláudio Jorge é o refinamento exalando categoria pelas seis cordas do instrumento que é quase parte de seu braço. Carlinhos Sete Cordas é o samba em frases de notas graves tiradas no bordão, a corda extra acrescentada ao violão tradicional. Juntos, embalados pela voz de Dorina cantando os versos de Candeia “Enquanto houver samba na veia/ Empunharei meu violão”, o samba se faz novo.Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4 e autor de O Gogó de Aquiles, ed. A Girafa. Seus textos são publicados semanalmente no Acontece na  no Diário do Comércio (ACSP), Meio Norte (Teresina), A Gazeta (Cuiabá), Jornal da Cidade (Poços de Caldas) e Brazilian Voice (EUA). No rádio, sempre às segundas-feiras, das 15h às 16h, "O Gogo de Aquiles" vai muito bem, obrigado. Você poderá escutá-lo (no Rio de Janeiro) sintonizando diretamente na Rádio Roquete Pinto, ou (fora do Rio) na internet: www.fm94.rj.gov.br .