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Selma Reis canta às palavras


Com um “Banho de Manjericão” (João Nogueira e Paulo César Pinheiro), peço pro santo pra rezar quebranto, cortar mau olhado; após o temporal, “As Forças da Natureza” (João Nogueira e PCP) vão resplandecer; “Cicatrizes” (Miltinho e PCP) abertas em chagas, arrasam, arruínam; o tempo da vida não muda, segue adiante como um “Passatempo” (PCP) que o tempo criou pra jogar; infernal cortesã, seu “Bolero de Satã” (Guinga e PCP) é para sempre; eu não aguento mais viver em paz, “Sem Companhia” (Ivor Lancellotti e PCP); nas “Bodas de Vidro” (Sueli Costa e PCP), embriagado pelo vinho que empoça a alma, perdemos o fio do pecado no próprio véu que vestimos; vou por “Cordilheiras” (Sueli Costa e PCP), de onde vejo a procissão dos suicidas caminhando para a morte pelo bem de nossas vidas; “Vou Deitar e Rolar” (Baden Powell e PCP), o vento que venta aqui é o mesmo que venta lá, quaquaraquaquá, quem riu? Pode ir armando o coreto e preparando aquele feijão preto, eu “Tô Voltando” (Maurício Tapajós e PCP); ó tristeza me desculpe, estou de malas prontas pra “Viagem” (João de Aquino e PCP), da qual voltaremos no alazão da noite cujo nome é raio, raio de luar; assim fiquei eu, sozinho tal como um “Velho Arvoredo” (Hélio Delmiro e PCP) que não serve ao tempo nem ao lenhador; salve o samba, salve a santa, salve ela, a “Portela na Avenida” (Mauro Duarte e PCP), desfilando triunfal sobre o altar do carnaval; Ele escreve, é seu “Ofício” (PCP): A música me ama, ela me deixa fazê-la (...) Nada que existe é mais forte e eu quero aprender-lhe a melodia, de como compõe minha vida, que é para compor minha morte; a palavra é “Minha Missão” (João Nogueira e PCP): Quando eu canto estou sentindo a luz de um santo, estou me ajoelhando aos pés de Deus. Com esta colcha de retalhos de letras e de títulos de músicas de Paulo César Pinheiro, associo-me a Selma Reis no tributo ao poeta, no qual, ao selecionar catorze de suas músicas e mais um poema recitado pelo próprio, ela conseguiu a proeza de dimensionar todo o talento do poeta no curto espaço de um CD.Cercada por músicos e arranjadores com vasto poder de traduzir a alma dos cantantes, Selma é emoção e técnica. Sua respiração permite alongar notas, dando sequência natural às divisões rítmicas e mais sentido às palavras; sua afinação é correta, vai bem nos agudos e, principalmente, nos graves; e seu vibrato possui o valor de ter o rigor dos grandes intérpretes.Por tudo, solos, naipes, interpretações dos instrumentistas e também pela participação especial de Robertinho Silva em “Banho de Manjericão”, de Diogo Nogueira em “As Forças da Natureza” e de Beth Carvalho em “Portela na Avenida”, o álbum só engrandece o desejo de Selma Reis de homenagear um dos mais profícuos compositores brasileiros.Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4