Loading...

Siba, o mestre cirandeiro


Feito rastilho de pólvora, aquele disco independente sacudiu a cabeça da moçada que se espremia para ver, ouvir e dançar com o grupo, que se apresentava semanalmente numa casa noturna de São Paulo. No palco se destacava o moço de bigode que usava chapéu. Rabequeiro, violeiro, cantador, arranjador e compositor, aquele era o mesmo Siba de hoje. Ele que, quando perguntado, humildemente disse que tudo o que ali era tocado e cantado fluía naturalmente e, portanto, seria “apenas” fruto do desejo dele e de seus companheiros de revelar ao mundo as musicalidades do povo nordestino de Pernambuco. Como se tudo o que estava naquele primeiro CD fosse obra da natureza e esta privilegiasse igualmente a todos.E o tempo seguiu. Chegou 2002. Siba ouviu seu mundo gritando a lhe chamar e correu para abraçá-lo. Pegou as tralhas, despediu-se dos companheiros do Mestre Ambrósio e voltou para a sua Nazaré da Mata. Abraçados, lá soltaram a voz e o verbo, e seu mundo de alegria pôs-se a cantar. O moço que andava pelas ruas de sua terra, aquela que só os que nela pisam dela sabem, se deixou ainda mais impregnar por aquela música envolta em barro e poesia. Enquanto se preparava para saltos mais profundos, fazia-se mais poeta e melhor compositor. Nascia o cirandeiro de ofício e criador da banda Fuloresta, que logo gravou o CD Fuloresta do Samba.E chega 2007. Siba e a Fuloresta criam Toda Vez Que Eu Dou Um Passo, O Mundo Sai do Lugar (Brazil Música). Para este novo trabalho ele amplia o naipe de metais da banda, que passa a contar com o trompete de Roberto Manoel, com a tuba de André Tubista, com o trombone de Galego do Trombone e com o sax-tenor de João Minuto. Nesse time estão centradas a beleza e a sabedoria do álbum. Siba escreve arranjos que ele, se ainda movido por aquela extrema humildade, talvez considere fruto “apenas” de sua observação curiosa. Ora, as orquestrações são espetaculares, prenhas de contrapontos e harmonias feitas sob medida para melodias que soam por caminhos insuspeitados. Além dos sopros, com ênfase para os solos de trompete e de tuba, há bombos e tarois segurando o ritmo que seduz e chacoalha os sentidos de quem o escuta. Biu Roque e Cosmo Antonio (tarol, bombo e voz), Mané Roque (mineiro e voz) e Zeca (póica) completam o Fuloresta e acentuam a pisada – ora do coco, ora da ciranda, ora do frevo. Música!Assim como os arranjos, chamam atenção os versos criados por Siba. Extremamente poéticos e bem-humorados, a força da música nordestina está no canto que vem da garganta deste também bom cantor. Com 12 faixas, o CD tem oito composições só de Siba. Além disso, há “Cantar Ciranda”, parceria com a cantora Céu, que participa cantando com ele; “Alados”, parceria com Dengue e Lúcio Maia, da Nação Zumbi, que toca guitarra (a música tem ainda a participação especial do pianista Arthur Faria e um belo arranjo); “12 Linhas”, com Zé Galdino, que participa cantando; e “A Folha da Bananeira”, que é só de Biu Roque, ele que faz a voz solo. O som que se ouve neste CD é o que alimenta grande parte do povo brasileiro, mas é desconhecido de outra e ainda maior parcela da nossa gente. Escutar Toda Vez Que Eu Dou Um Passo, O Mundo Sai do Lugar é um jeito precioso de ter contato com a diversidade e com a rara e pouco conhecida beleza da música do nordeste intenso. Não bastasse Siba ser um grande músico e pesquisador, sua contribuição para a divulgação e a continuidade da cultura musical pernambucana é hoje fundamental.Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4 e autor de O Gogó de Aquiles, ed. A Girafa. Seus textos são publicados semanalmente no Acontece na  no Diário do Comércio (ACSP), Meio Norte (Teresina), A Gazeta (Cuiabá), Jornal da Cidade (Poços de Caldas) e Brazilian Voice (EUA). No rádio, sempre às segundas-feiras, das 15h às 16h, "O Gogo de Aquiles" vai muito bem, obrigado. Você poderá escutá-lo (no Rio de Janeiro) sintonizando diretamente na Rádio Roquete Pinto, ou (fora do Rio) na internet: www.fm94.rj.gov.br .