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Sublimes violões


Tudo começou com dois violonistas que viram na inclusão de uma corda mais grave (afinada em dó), além das seis do violão, a possibilidade de aumentar as possibilidades harmônicas do instrumento. Tute (Arthur de Souza Nascimento) e China (Otávio Vianna, irmão mais velho de Pixinguinha) foram os violonistas responsáveis pela mudança (ainda segundo Mauricio Carrilho).  Através deles, a arte de fazer do bordão o pulo do gato para criar fraseados emancipou ainda mais a divisão rítmica do choro, da valsa e do samba. Com o recurso dos graves do bordão, os contrapontos ganharam tanta importância quanto sempre tiveram as sequências melódicas e harmônicas. Logo após Tute e China, já no final dos anos 1950, Horondino José da Silva (o Dino Sete Cordas) incorporou a sétima corda ao seu violão. Foi o trampolim para que, dentre outros craques, Raphael Rabello, Hélio Delmiro e Marco Pereira se fizessem expoentes no instrumento. E é a Dino, Raphael, Delmiro e Marco que Yamandu Costa e Rogério Caetano dedicam o CD Yamandu Costa e Rogério Caetano (Delira Música). Somadas, as sete cordas de náilon de Yamandu e as sete de aço de Rogério compõem uma orquestra libertária de sons inimagináveis que timbram de forma definitivamente admirável.Rogério e Yamandu gravaram doze faixas que são como uma única música, na qual a virtuosidade se agrega ao improviso e chega à concisão. O repertório vai de composições dos dois a Pixinguinha, Ernesto Nazareth e Lalão, passando pelo australiano Doug de Vries e também por músicas de Marco Pereira e Hélio Delmiro.Gênios do instrumento em que mestres brilharam, a música se dá a Rogério e a Yamandu como se dissesse: “Façam de mim o que quiserem!”. No sublime calor das cordas, às vezes com afinações díspares, indo aos acordes como se fosse o último suspiro da tradição somada à modernidade, a sonoridade explode com imoderada acuidade. A pegada se cria em arpejos e improvisações. Os arranjos, todos de Yamandu e Rogério, têm a sofisticação de uma peça criada em ourivesaria. Frases tocadas ligeiras, em profusão de notas límpidas (“Amigo Violão”, de Rogério Caetano e “Frevinho”, de Yamandu); momentos pungentes (“Vou Vivendo”, de Pixinguinha e Benedito Lacerda); delicadeza em acentuações suaves (“Fidalga”, de Ernesto Nazareth); fraseado lírico e harmônico (“Choro em Mi Maior”, de Raphael Rabello)... É a música se entregando a eles, tocando para eles, deixando-se recompor nos dedos dos instrumentistas. Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4