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Um menino renovador


Ele é pouco conhecido do grande público – nada a estranhar num país que costuma reservar seus aplausos mais intensos e calorosos aos que compõem e cantam –, mas guitarra, violões de seis e de sete cordas, violão tenor, bandolim, banjo e cavaquinho estão para ele como para ele perfeitamente está o ofício de arranjador. Zé Menezes, aos 86 anos, é referência de músico múltiplo. Inquieto, na busca de música que ressoe a sua genialidade, os setenta anos que tem de carreira o traduzem e destacam. Neste CD (independente, com apoio da Petrobras) Zé Menezes / Autoral – Gafieira Carioca, segundo de uma série que contempla a sua obra, estão 14 músicas interpretadas ao sabor das grandes orquestras que animam os salões onde se dança e se ouve música da melhor qualidade. Apoiado por um naipe de sopros que tem como base a flauta e os saxes soprano e alto de Daniela Spielmann, o sax tenor e a flauta de Zé Carlos Bigorna, o trompete e o flugelhorn de Vander Nascimento e o trombone de Sérgio de Jesus, Zé Menezes demonstra que seu forte não é só o dedilhar das cordas de diversos instrumentos – ou ao menos não é apenas ali que reside sua maior competência como músico. Seus arranjos soam magicamente através dos sopros desses virtuosos, a quem, ao longo do álbum, ainda se juntam Carlos Malta, com flauta e pífano, e Vander Nascimento, com trompete e flugelhorn. Zé Menezes arregimentou ainda Nicolas Krassik, violino, Lê Matos, cavaquinho, Marcelo Caldi, acordeom e piano, e Marcello Gonçalves, violão de sete cordas. Mas é graças a uma cozinha irrepreensível, integrada pela bateria de Fernando Pereira, pelo baixo de Luís Louchard e pela percussão de Beto Cazes, que tudo se sustenta e brilha. A segurança e o suingue que essas três feras transmitem ao arranjador e, por conseqüência, aos demais instrumentistas da orquestra, permitem que Zé Menezes / Autoral – Gafieira Carioca seja um dos melhores discos instrumentais lançados recentemente.O disco começa com “Gafieira no Bronx”, de Zé Menezes – com exceção de quatro músicas feitas em parceria com Luiz Bittencourt, todas as outras faixas do repertório do CD são de sua autoria –, quando desponta a força do naipe de sopros que dá de bandeja ao piano a condução da linha melódica. Este a devolve para o solo de trompete. Segue-se “Uma Noite na Lapa”, com belos solos de piano, trombone e sax, e “Bossa Nova Nº 1”, na qual, mais uma vez, o saxofone tem evidência Interessante é notar que, nessas três músicas iniciais, Zé Menezes se reserva o segundo plano, como se para fazer brilhar primeiro seus companheiros de viagem musical. Consegue. E com isso, genial que é, dá o sinal de que sua verve de arranjador está ainda mais afiada que nunca.Mas se ele estava se preservando para as faixas seguintes, sua força não tarda a surgir. “Encabulado”, um de seus choros famosos, tem no desenho criado por sua guitarra a marca de virtuoso que não nega fogo. E logo vêm “Gafieirando”, na qual sua guitarra se integra ao piano de Marcelo Caldi (e os dois conseguem ser tão dançantes quanto jazzísticos); “Dani no Frevo”, em que brilha o violão tenor do mestre; “Comigo É Assim”, quando ele junta a sonoridade de seu violão tenor à da guitarra, e “Nova Ilusão”, quando se vale de duas guitarras para brilhantemente frasear. Tudo junto no mesmo compasso da modernidade que se vale da habilidade de criação do músico brasileiro, aqui personalizado pelo talento ilimitado desse menino de quase 90 anos que toca como quem brinca, enquanto cria a melhor e mais diversificada música do mundo.Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4 e autor de O Gogó de Aquiles, ed. A Girafa. Seus textos são publicados semanalmente no Acontece na  no Diário do Comércio (ACSP), Meio Norte (Teresina), A Gazeta (Cuiabá), Jornal da Cidade (Poços de Caldas) e Brazilian Voice (EUA). No rádio, sempre às segundas-feiras, das 15h às 16h, "O Gogo de Aquiles" vai muito bem, obrigado. Você poderá escutá-lo (no Rio de Janeiro) sintonizando diretamente na Rádio Roquete Pinto, ou (fora do Rio) na internet: www.fm94.rj.gov.br .