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- Eu, a poesia e vício-versa –


Todas as manhãs pergunto
no que minha fé quer acreditar
E saio porta afora,
devoto de por acasos

Numa estrada de terra
encosta de capim-manteiga
vai da minha percepção
até meu distrair
Piso em barros
Lembro-me de Manoel

O canto de alguns pássaros
traz um rasgo de aurora

Um rio vomita de sua garganta
sua voz em cachoeira

Os cheiros inertes de sol
encardem meu coração de manoelices

Lambo as palavras
depois me alucino

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Poesia, entorpecente inalável, mastigável
Letras fermentadas
Fonemas destilados
Veneno sem antídoto
Porto e fonte de divagações, conclusões
Conviver com meu Eu
Algo impossível para meu Você
Guardo tanto amor próprio
que, vez em quando, tenho saudades de mim

Oro pros anjos
Brindo a Augusto
Na intimidade de versos
beijo bocas que me escarram
Sigo firme com a ingratidão, doce companhia inseparável

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Todos os dias penso no mundo
Na correria do mundo, na hipocrisia do mundo
Pô, Ética, me esquece
Poética me estressa
Senhor, ignorai a nossa prece
Senhor, escutai a nossa pressa

Ora os reis de Ricardo
Ora os campos de Álvaro
Finjo tão completamente ser pessoas
Evoco Fernando
Vejo Deus nas flores
E árvores
E montanhas
Encho-me de nada
E desencontro a metafísica

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Todas as tardes ensino-me nostalgias
Aprendo muito comigo
Sobre a opinião:
Não ofereço a outra face
pois não sou duas caras
Sobre a contradição:
A boca tem mais trabalho
quando a conversa é vagabunda
Sobre a certeza:
Estou convicto
que não sei

Todas as noites saio de casa
só pras estrelas poderem
ficar me contando

Todas as auroras reencontro lençóis
Trôpego de métrica
Embriagado de estrofes
Seringas líricas em veias rudes
Rimas on the rocks
Só durmo depois de fazer fumaça de versos
De secar as garrafas dos versos
Extasiado, ardo
Subverto os morais
Agradeço a Vinícius

Aborto minha abstinência com poemas


Poema que dá nome ao meu terceiro livro, lançado em 2008.