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Nelson Rodrigues, o Maldito Necessário

Divulgação


Nelson Falcão Rodrigues nasceu no Recife em 23 de agosto de 1912 e faleceu em 21 de dezembro de 1980, no Rio de Janeiro. Passou a infância no bairro Aldeia Campista (situado entre Vila Isabel e Tijuca), na Zona Norte da cidade. O pai era jornalista e dono de jornal. Teve o irmão Roberto Rodrigues, desenhista, assassinado na própria redação em 1929. Outro de seus irmãos, o comentarista de futebol Mário Filho, nome verdadeiro do Estádio do Maracanã, destacou-se na crônica futebolística, assim como o próprio Nélson. Sua irmã foi casada com o poeta e tradutor Antônio Fraga.


Escreveu romances, folhetins, crônicas, contos, peças de teatro e roteiro para cinema. Atuou como comentarista de futebol e chegou a trabalhar como ator em uma de suas peças, mais precisamente, “Perdoa-me por me traíres”, ao lado do ator Gláucio Gil. Teve várias de suas obras adaptadas para cinema e televisão, principalmente para casos especiais da TV Globo.


Considerado extremamente reacionário, era capaz de fazer comentários satisfatórios em relação à ditadura militar instalada no Brasil de 1964 a 1984 e ainda chamar a esquerda brasileira de “esquerda festiva”.


Quanto a ser reacionário, isto nunca afetou a qualidade de sua obra, assim como a de outro grande escritor, o poeta Manuel Bandeira, também, extremamente reacionário chegou a chamar o cronista e jornalista Heitor Cony de mau caráter e romper a amizade. Isto porque o jornalista foi o primeiro a escrever sobre o golpe militar de 1964, chamando os militares de gorilas. À época, o poeta chileno Pablo Neruda escreveu para Heitor Cony parabenizando-o por tal feito. O poeta amazonense Thiago de Mello escreveu o poema “Estatutos do Homem” e o dedicou, meses depois, a Cony como forma de reconhecimento por sua luta contra a ditadura recém-instalada.


Manuel Bandeira era a favor dos militares assim, como Nélson Rodrigues, que cansou de pedir favores a seus amigos generais para amenizar as estripulias do filho Nelsinho Rodrigues, militante da esquerda na época.


Da obra literária de Nélson Rodrigues existe boa parte ainda inédita, principalmente, cartas de amor endereçadas a certa esposa de ministro de Getúlio Vargas.


Sua obra teatral é a que mais controvérsia causou no público e na crítica especializada. Gilberto Velho disse certa vez:


“Em Nelson Rodrigues a temática do desvio é permanente”.


Em sua obra é latente a releitura dos mesmos códigos, indicando o caráter multifacetado e ambíguo da vida cultural, lembrando que a sociedade está em constante estado de anomie - doente, instável -.


Sua obra parte de uma patologia social, chegando a uma patologia individual, na qual o indivíduo em estado de anomia tem certos comportamentos de caráter inovador. Nelson, assim como sua obra, também traz como indivíduo este caráter de anomalia perante as outras pessoas, este comportamento inovador, sendo perfilado com outras personalidades de uma lista seleta que inclui Gláuber Rocha, Chico Buarque, Caetano Veloso e Oswald de Andrade, entre poucos outros.


Há uma grande relação entre os textos de Nelson Rodrigues e o “Rito Dionisíaco” grego. Esta relação está mais ao nível do “Drama-satírico” à medida que é no “Agón” (Agonia) que ele desenrola o perfil psicológico de seus personagens.


Para ele a tragédia do ser humano é a incansável e louca procura de seu próprio sentido e sua necessidade de definir os lugares, tanto os que ocupam, quanto os que as pessoas ocupam em relação a ele, o que se dá através da consciência das posições.


Nelson Rodrigues parte desta escola – que não é racionalista – para libertar seus personagens, pouco se importando com o “racional”, que tem como base uma atitude messiânica e tenta explicar determinados conceitos de posicionamentos através de lugares na sociedade – mães, pai, irmão, inimigo, amante etc.


O teatro brasileiro pode ser dividido em A.N (antes de Nelson) e D. N (depois de Nelson).


Em 9 de dezembro de 1942 era levado ao palco a sua primeira peça, “A Mulher Sem Pecado”. Contudo, o grande marco na carreira do dramaturgo se deu no ano de 1943 com a estreia da peça “Vestido de Noiva”, dirigida por Ziembinski e encenada pelo grupo amador “Os Comediantes” no Rio de Janeiro.


A trama da peça se desenrola basicamente através de três planos:


“Alucinação”, passando pelo plano da “Memória” e chegando ao da “Realidade”.


No plano da “Alucinação” (imaginário) Alaíde, a personagem central da trama, dá vazão as suas aspirações inconscientes.


No plano da “Memória”, a personagem demonstra o sentido simbólico que as pessoas têm para com ela.


No plano da “Realidade” existe o fato acontecido, o qual ela ainda desconhece a sua condição de vítima.


Através desses três planos, que atuam em conjunto no texto, é que o autor rompe com a lógica temporal Aristotélica (começo, meio e fim) e instaura o sentido lógico, quebrando com o tempo/espaço e a realidade cronológica, editando um espaço-tempo psicológico, coisa que ainda não fora tentado no teatro brasileiro até então.


A peça “Vestido de Noiva” revolucionou o teatro brasileiro em vários aspectos, sendo um deles o rompimento com a mesmice da temática da época, que se restringia em sua maior parte às paródias portuguesas e ao teatro nacionalista.


As temáticas eram, em sua maior parte, nacionalistas e muito regionais. Nelson abre em suas peças uma discussão mais universalista, um tanto quanto shakespeariana, não desmerecendo alguns autores brasileiros daquela época como as tímidas investidas de Oduvaldo Vianna em 1920, quando ele abandona a prosódia portuguesa, abrasileirando a maneiras de falar. As peças do carioca Joracy Camargo, principalmente, “Deus lhe Pague”, e as obras do paulista Oswald de Andrade em “A Morta” e “O Homem e o Cavalo”, responsáveis por certa ousadia no nosso teatro do começo do século XX até a década de 1940 e em caso específico, montada quase 30 anos, depois em 1967, por Zé Celso Martinez Correa o texto “O Rei da Vela”, de Oswald de Andrade. Contudo, em Nelson Rodrigues as inovações assumem um caráter menos transitório e mais consistente.


Ele explica toda a trama-incestuosa que existe em qualquer tipo de sociedade, demonstrando que a imoralidade e outros tipos de relacionamentos coexistem, podendo acontecer e ser aceitos, que a traição, o ódio, o desprezo, assim como o amor, o carinho etc, são sentimentos e posições que assumimos para nos definirmos sentimentalmente perante o “outro”.


Para o autor, o “homem” é nada mais, nada menos que um animal impotente-sentimental que precisa simbolizar e explicitar a sua condição, necessitando assim, do outro, para lhe dar sentido.


O crítico Sábato Magaldi, aproveitando algumas indicações do próprio Nelson Rodrigues, dividiu suas peças em quatro grandes blocos:


Peças Psicológicas: “A Mulher Sem Pecado” (1941), “Vestido de Noiva” (1943), “Valsa nº 6” (1951), “Viúva, Porém, Honesta” (1957) e “Anti- Nelson Rodrigues”, de 1974.


Peças Míticas: “Álbum de Família” (1945), “Anjo Negro” (1946), “Doroteia” (1947) e “Senhora dos Afogados”, de 1954.


Tragédias Cariocas I: “A falecida” (1953), “Perdoa-me por Me Traíres” (1957), “Os sete Gatinhos” (1958) e “Boca de Ouro”, de 1959.


Tragédias Cariocas II: “O Beijo no Asfalto” (1960), “Bonitinha, mais Ordinária” (1961), “Toda Nudez Será Castiga” (1965) e “A Serpente”, de 1979.


Em sua esteia, no ano de 1941 com “A Mulher Sem Pecado” o autor já mostrava a sua linha de pensamento. De acordo com Joaquim Ferreira dos Santos, muito tempo depois:

 

 

“... que desde de sua estreia, em 1941, com A Mulher Sem Pecado, tinha como objetivo principal anarquizar a patologia das relações familiares.”



A obra teatral de rodrigueana situa-se com uma semântica singular no panorama teatral e suas características se resumem em técnicas de linguagem cênicas, sendo elas: a dinâmica cinematográfica, a fotografia, o Rito Ditirâmbico e o palco como unidade do drama, além de estarem ligadas à tradição da dramaturgia, tais como o Naturalismo, o Absurdo, o Melodrama e o Realismo,todos em uma colagem única, como um grande mosaico, em que cada pedaço completa o sentido do outro, mas tem seu sentido próprio.


Segundo o professor na Universidade de Essex (Inglaterra) Ramiro Silveira:

 

“Nelson fala da alma humana, e a alma não tem pátria. Suas obras estão cada vez mais atuais. A maneira como ele investiga o desejo, a moral, a família, fala profundamente do ser humano e se comunica com qualquer nacionalidade.”



O autor em seus textos expõe sua condição fatalista através da condução e condição machadiana, do desvinculo dos centrísmos dos saberes e de forma irônica e metafórica, chegando a tal ponto, como dizem Carlos Vogt e Berta Waldman no livro “A Flor da Obsessão” aludindo ao psicanalista Hélio Peregrino:


“Ele trabalha com o dia a dia infame, o cotidiano prosaico, o sórdido e o banal e faz neles aparecer o épico, o profundo, o universal, o trágico e o sublime”.


Reunindo em uma só pessoa esses antagonismos equilibrados, Nelson Rodrigues torna-se não só o autor de suas peças, mas confundindo-se com seus próprios personagens, transformando-se em uma figura polêmica, amado e odiado por tantos, de acordo com uma sentença proferida por Otto Lara Resende, escritor e amigo íntimo de Nelson:


“O Nelson Rodrigues, vocês sabem, a gente mata, ou ama, como o Código Penal pune assassinato, só nos resta amá-lo”.


Talvez toda essa repulsa por parte dos críticos e em algumas peças, por parte do público, tenha se iniciado por ele estar inserido em uma temática e forma que foi denominada e aceita por alguns críticos com “Teatro Desagradável”, que se iniciou com a peça “Álbum de Família”, de 1945.


Esta peça desagradou mais do que o autor pretendia. O poeta Manuel Bandeira chegou a aconselhá-lo a escrever sobre pessoas normais. A crítica caiu de pau no texto. A censura proibiu e o público fez eco à polêmica dos jornais da época. Nelson desafinou geral o coro dos contentes. No ponto de vista dos intelectuais, censura, amigos e inimigos ele parecia um ser totalmente distópico e disso gostava, pois a razão principal para ele era a ruptura com as convenções e regras da dramaturgia.


Na peça são expostos toda a sorte de relacionamentos, indo do Incesto ao Complexo de Édipo, do Complexo de Electra à quebra total da monotonia dos posicionamentos dos lugares da família na nossa sociedade patriarcal.


A peça “Álbum de Família” e sua trama são desenroladas na exposição de sete fotos e tem como base a expectativa da comunidade. Porém, é nas entre-fotos que realmente é desenrolada a trama, na qual, enfim, se faz a denúncia do que é obstruído pela versão oficial. Chegando a usar os mesmos termos do código familiar, mas não os mesmos sistemas de significação.


O Teatro Desagradável, nos termos desta peça em questão, traduz o nosso inconsciente e todo o deslocamento da nossa significação. Sófocles na peça “Édipo Rei” iniciou o debate desta temática na Grécia antiga. Quando Édipo fura os próprios olhos, cegando-se por descobrir que tinha possuído sexualmente a própria mãe é que ele nos dá a visão, a sua cegueira é a nossa visão.


Em Nelson desagradável Rodrigues o texto “Álbum de Família” nos leva a crer no acerto dos ponteiros simbólicos, no qual a trama incestuosa nos demonstra a impotência sentimental do ser.


A peça discorre em uma versão não oficial do álbum – em uma versão entre-fotos – na qual há o desprendimento do desejo, isto é, o deslocamento em busca do sentido, fundamentando o próprio sentido de tragédia para o autor.


A peça “Anjo Negro”, estreada em abril de 1948, faz parte das “Peças Míticas” do autor.


A ação se passa em qualquer lugar e lugar. Por isto, o texto é sempre atual ao tempo e ao espaço em que é encenado.


A principal dificuldade da estreia do texto se deu na constante briga com os censores na época. Racistas, os censores proibiram as cenas sensuais entre um negro (no caso o protagonista Ismael) com uma mulher branca. A saída para a montagem da peça foi a substituição do ator negro por um ator branco (pintado de preto).


Ironia destino, a peça fala justamente sobre o racismo, que o negro Ismael luta para desmistificar, tanto o racismo interior (do personagem) quanto o exterior e por consequência os problemas acarretados.


Em “Os Sete Gatinhos”, estreada em 1958 no teatro Carlos Gomes, na Praça Tiradentes, segundo um de seus amigos, o embaixador Paschoal Carlos Magno:



“Esta peça é o que há de mais abjeto, repelente, sórdido, repulsivo e nojento.”



Com relação à crítica e principalmente, aos críticos, Nelson Rodrigues declarou em entrevista ao jornal Última Hora nesta época:



“Não me espanta a atitude da crítica. Se existisse um rapa intelectual, um rapa de inteligência, quantos colunistas de teatro ainda restariam impunes? Eu digo rapa e já me inclino a uma retificação: a carrocinha de cachorro. Considero uma injustiça que se cacem os cães vadios e se poupem certos críticos que são os vira-latas do teatro. Por que caçar um com os laços de arame e não caçar também os vira-latas impressos? A única desculpa que a limpeza pública pode dar é a seguinte: um crítico de teatro é invencível. Vejam Henrique Oscar, é imortal. Daqui a mil anos estará ostentando a mesma obtusidade eterna. Ele pode parecer perecível como todos nós. Mas ficará depois de nós. Através dos séculos pode mudar de cara, de nome e terno, mas é a mesma burrice intransferível e milenar. O gênio passa, o idiota não. Não sei, amigos, não sei se a alma é imortal. Mas a burrice o é.”



Duas curiosidades sobre um dos textos de Nelson Rodrigues e sua atuação como roteirista em “O Boca de Ouro”.


No ano de 1963 foi levado às telas o filme "O Boca de Ouro", dirigido por Nélson Pereira dos Santos, com roteiro escrito em parceria com o próprio Nelson Rodrigues e trilha composta por Remo Usai. Dos atores que participaram constam Jece Valadão, Daniel Filho, Odete Lara, Wilson Grey, Maurício do Valle e Zé Kéti. A cantora Maria Bethânia iniciou a carreira artística neste mesmo ano de 1963, quando atuou na peça teatral "O Boca de Ouro", dirigida por Alvinho Guimarães e musicada por Caetano Veloso, que abria o espetáculo cantando um samba de Ataulfo Alves.


Neste mesmo ano, de 1963, outro texto também fora vertido para o cinema foi “Bonitinha, Mas Ordinária”. Primeira adaptação para este texto e com direção de J.P. de Carvalho, o filme contou com roteiro de Nelson Rodrigues, Jorge Dória e Jece Valadão.


No ano de 1993, em comemoração aos 50 anos da peça “Vestido de Noiva”, o diretor teatral Luís Artur Nunes montou o texto e afirma:


“É um equívoco entender o Nelson como inimigo das mulheres. Examinando a obra, a gente vê que ele retrata com muita intensidade o abuso e a exploração contra as mulheres na sociedade contemporânea. É preciso ir além do Nelson frasista de efeito, debochado, e chegar ao homem mais preocupado com as questões substantivas do ser humano.”


Em 2001, Joffre Rodrigues, filho do autor, junto à FUNARTE, organizou a tradução de 10 peças para a língua inglesa.


A polivalência do autor sempre o levou a outros campos na literatura desde muito cedo, antes mesmo de se interessar pelo texto teatral.


O próprio Nélson se dizia um “Romancista frustrado”, tendo em vista a sua admiração por Dostoievsky, inclusive, a proximidade dos autores é latente e percebível em ambos os textos ácidos, ainda que em gêneros diferentes.


Em 2004 o gaúcho Caco Coelho publicou o livro “O baú de Nelson Rodrigues”, uma compilação de textos envolvendo crônicas de futebol, crítica de ópera e reportagens policiais, escritos entre 1925 e 1954. 


No ano de 2005, para lembrar os 25 anos da morte do dramaturgo, Nélson Rodrigues Filho e a filha, a atriz Cristiane Rodrigues (neta do escritor) idealizaram o projeto “25 anos sem Nélson Rodrigues”, apresentado no Teatro Nelson Rodrigues, no Conjunto Cultural da Caixa Econômica, no Rio de Janeiro.


O evento incluiu peças, leituras dramatizadas, filmes e exposição, além de debates sobre a obra do autor no teatro que já é uma homenagem a sua pessoa.


O evento incluiu peças, leituras dramatizadas, filmes e exposição, além de debates sobre a obra do autor no Teatro Nelson Rodrigues, que leva seu nome.


Vale lembrar que o antigo Teatro BNH, na Avenida República do Paraguai, recebeu o nome do teatrólogo devido a uma grande campanha há que começou com o seu ex-diretor Paulo Roberto de Oliveira.

Amigo pessoal de Nelson Rodrigues, com quem almoçava toda quinta-feira no apartamento do autor, na Avenida Atlântica, e em um desses almoços chegou a comentar quando com ele, que apenas respondeu:


- Que beleza!

 

Contudo, ciente de que a lei brasileira proíbe a nomeação de logradores e prédio públicos enquanto a pessoa estiver viva.


No dia do velório do dramaturgo, em dezembro de 1980, Paulo sugeriu à Dona Elza, viúva do autor, que levasse essa proposta à classe artística e ao governo. Com o apoio de Arnaldo Niskier, Secretário de Cultura e Educação na ocasião, e de toda a impressa, o espaço foi renomeado para Teatro Nélson Rodrigues.


Em 2009 sua peça “A Vida Como Ela É” foi traduzida para a língua inglesa e lançada nos Estados Unidos.


No início do ano de 2012 os herdeiros do escritor, que teve seis filhos com três mulheres diferentes, se encontraram em audiência na 11ª Vara de Órfãos e Sucessões, no Rio de Janeiro, onde corre desde 1981 o processo de inventário de Nelson Rodrigues, para tratar dos direitos autorais da obra do autor.


Ficou acertado a formação de uma comissão gestora, formada por Nelsinho Rodrigues, Maria Rodrigues Müller e o advogado Pedro Amaral representando Daniela (com paralisia cerebral e filha do autor com Lúcia). Também somados ao espólio estão a viúva Elza, com 94 anos (mãe de Nelsinho e Jofre) e Paulo César, irmão de Sonia e Maria Rodrigues Muller.


Em março de 2012 a temporada de comemoração ao centenário do autor iniciou com a montagem de “Vestido de Noiva”, no Centro Cultura Banco do Brasil, sob direção do gaúcho Caco Coelho, que declarou ao jornalista Luiz Fernando Vianna, do “Segundo Caderno”, que todo o teatro do Nelson é absurdo, o dramaturgo escreveu “Vestido de Noiva” antes de Samuel Becker e Eugène Ionesco, considerados os maiores nomes do teatro do absurdo, produzirem suas principais peças.


Em julho, deste mesmo ano de 2012, a filha Maria Lúcia Rodrigues Muller fez a curadoria da exposição “Ocupação Nelson Rodrigues”, no Itaú Cultural, em São Paulo.


Em agosto de 2012, mês de nascimento do homenageado, o filho Nelson Rodrigues Filho e a Crica Rodrigues (neta do autor) deram início à mostra “A gosto de Nelson”, na qual foram encenadas nos teatros Dulcina e Glauce Rocha, ambos no Centro do Rio de Janeiro, as 17 peças do autor, anteriormente montadas em 11 estados brasileiros.


Em declaração ao jornalista Luiz Felipe Reis, de O Globo, Nelsinho Rodrigues afirmou:



“É a primeira vez que a obra do velho ganha uma retrospectiva completa.”



As comemorações foram até o final de 2012, quando, segundo o próprio Nelsinho, foi encenada uma nova montagem de “Vestido de Noiva”, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, estreada em 28 de dezembro (o mesmo dia da estreia original em 1943), com reedição do cenário de Tomás Santa Rosa.


As homenagens seguiram além das montagens programadas em vários palcos como Sala Baden Powell, Teatro Gláucio Gil, Carlos Gomes, entre outros.

A Editora Nova Fronteira prepara a reedição das obras completas do dramaturgo e houve a exposição “Expulsão do Paraíso, A Serpente”, no Teatro Nelson Rodrigues, no Rio de Janeiro, além das exposições “Ocupação Nelson Rodrigues”, em Recife e “100 vezes Nelson – Nelson Rodrigues e o Rio de Janeiro” em três bibliotecas públicas do Rio de Janeiro.

Sonia Rodrigues, filha do escritor, lançou em abril o livro “Nelson Rodrigues por ele mesmo”, uma narrativa em primeira pessoa, na qual foram entrelaçados textos de entrevistas e depoimentos do dramaturgo.

Em setembro, deste mesmo ano, foi lançada a compilação de textos futebolísticos do autor intitulada “Brasil em campo”, também feita por Sonia Rodrigues.


Enfim... as comemorações do centenário do autor foram até dezembro de 2012, com a presença de vários nelsonrodrigueanos.


No ano de 2019 Sacha Rodrigues, neto de Nelson, foi um dos idealizadores do evento “Nelson Rodrigues Festival London”, apresentado no Trafagar Square, em Londres, no qual aconteceram as leituras de peças, exposição de objetos do autor, palestras e lançamento das traduções de sete de seus textos para o inglês, vertidos sob a orientação do Departamento de Estudos Latino-Americano de King’s College of London, considerado a maior autoridade inglesa em traduções de textos latinos. De acordo com matéria do jornalista Gustavo Pinheiro, no Segundo Caderno, do Jornal O Globo, foi lançada pela editora Oberon a coleção intitulada “Nelson Rodrigues – Selected plays” reuniu as peças “The wedding dress” (Vestido de Noiva); “Forgive me for your betrayal” (Perdoa-me por me traíres); “All nudity Will be punished” (Toda nudez será castigada); “The seven litle kittens” (Os Sete Gatinhos); “Waltz # 6” (Valsa número 6); “Black Angel” (Anjo Negro) e “Family portraits” (Álbum de Família).


“É um desafio porque ele é um cânone. A forma como escreve e as idiossincrasias que ele usa são referência até hoje. Nenhum outro dramaturgo brasileiro criou um universo tão complexo e marcante.” Registrou Almiro Andrade, que ao lado de Susannah Finzi e Daniel Hahn foram os responsáveis pela tradução.


“Por mais aviltante que seja o tratamento de um personagem e cause revolta ao leitor ou ao espectador, trata-se de uma crítica, para que a sociedade veja o quão absurdo é o seu comportamento. Fugir do horror proposto pelo Nelson é não se matar fiel à provocação do autor”, aduziu Ramiro Silveira.


Ainda que universo Rodrigueano se passe no Rio de Janeiro entre as décadas de 1940 e 1960, ainda assim, em sua maior parte, os textos não são datados, pois se sabe que a alma humana não tem pátria e os sentimos são comuns a qualquer povo, em mais ou menor intensidade: ódio, amor, inveja, raiva, vingança, paixão, machismo, discriminação, misoginia, incesto e pedofilia, por exemplos, fazem parte do repertório de qualquer ser humano em qualquer época.  O que Nélson Rodrigues expõe em seus textos, e com dureza, é propor o contate a alguns destes sentimentos e posicionamentos através do conhecimento prévio, da exposição, do ridículo, causando certa náusea no espectador, para que este tenha reação àquilo tudo.


Euclides Amaral


Poeta e pesquisador de MPB, autor de 12 livros, entre os quais “Alguns Aspecto da MPB” (ensaios/2008), “O Guitarrista Victor Biglione & a MPB” (perfil artístico/2009), “POESIA RESUMIDA” (antologia poética, 2013) e “A Letra & a Poesia na MPB: Semelhanças & Diferenças”, em 2019. Como letrista possui cerca de 80 composições gravadas por vários parceiros e intérpretes.



BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:


SANTOS, Joaquim Ferreira dos. Feliz 1958: O ano que não devia acabar. Rio de Janeiro: Editora Record, 1997.

VAZ, Toninho. A biografia de Torquato Neto. Curitiba: Editora Nossa Cultura, 2013

WALDAMN, Berta, VOGT, Carlos. Nelson Rodrigues: Flor da Obsessão. Coleção Encanto Radical. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985.