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Manifesto


Os poetas devem existir para glorificar o melhor e o pior da vida. Para agitar, para mexer, para escandalizar com a ordem estabelecida das coisas, para instaurar novas. Para deflagrar, para revolucionar conceitos do que é belo, do ético, do social, do cultural. Se não for para isso não vale a pena a poesia. Para insuflar mudanças, para quebrar barreiras, para derrubar preconceitos, para espalhar luzes, para abrir caminhos, para queimar o que não presta, o que empata o aparecimento do novo. Se não for para isso não vale a pena a poesia.Um papel branco solto de um dos maiores edifícios do mundo, ao vento, ao ar do universo. Alimento, estrada, cama, mesa, o um, os muitos. Um pássaro voando de um lado para outro. Um homem errante entre sons urbanos. Para mexer com a linguagem, para gerar atalhos, para provocar, para tonificar o sentido das palavras, para inflexionar o moderno, para ser a bomba-relógio no coração do mundo, para ser a sensação do explosivo, do mais caótico, do zero, etc.Borboletas brancas numa área pútrida. Para rasgar os céus das coisas, para ser gente entre os bichos, para trafegar entre as estações, para transformar o cotidiano, o possível e o impossível de tudo. Para elevar, para levantar, para fazer alianças vanguardistas, experimentais.Para cuspir sobre o lixo do hoje, para armar pontes, gerar poentes, para ser estraçalhadora, para não ser conformada com as estruturas atuais do pensamento. Para remexer na terra, para ser estourada, para ser o coração na garganta gritante. Para não ser cego com as injustiças, as desigualdades, o hoje. Para adiantar o tempo, para danificar o vácuo do presente. Se não for para isso, de que serve a poesia?Para dar informações, sinais. Para ser pedra no sapato do não-pensamento, para ser performances entre surdos, para ser o berro entre montanhas. Para espalhar sua chama, para instaurar uma outra ótica geral, o gozo entre lerdos e impotentes, a humaindade entre homens, o desespero, a lama entre os dentes da civilização, para a podridão vir à tona, a ruptura entre as horas lentas do convencional, o choque, o estampido, a luz do verão varando as trevas do tempo cariado de utopias. Para ser som, lapidação. Para martelar nas teclas do saber, para espantar a ignorância, para ser simples no desenrolar dos fios, para ser  antenada, para ser desbloqueada, para ser plugada no que aparecer, para ser as cores vivas no estalo das descobertas. Para ser límpida, para ser maior, para ser universal. Para ser tudo, enquanto tudo, para fazer. Para ser poesia, senão não vale a pena.Para ser interrogação, para gerar apreensões, para ser Maria-chiquinha na cabeça dos otários, para ser Maria-sem-vergonha no jardim dos caretas. Para Acelerar o normal, para provocar o riso, a galhofa, a respiração livre. Para ser silêncio entre ritmos, para ser dança entre e dentro das palavras. Para falar bastante, para ter algo a dizer. Para não colaborar com a cristalização e brutalização da sensibilidade do homem contemporâneo. Para ser reveladora, mesmo no que está mais escondido. Para ser um nó difícil de desatar, um portão de estradas sem portão. Para ser como a visão das estrelas a olho nu. Para ser como portas se abrindo infinitamente. A poesia deve nos colocar à deriva. Deve nos tirar a sonolência, deve nos manter aceso. Por entre a grama no cimento entre paralelepípedos. Para nos alertar dos perigos a todo instante.