Loading...

Ingrid Bergman


A primeira vez que vi Ingrid Bergman foi em Intermezzo já em Hollywood, ao lado de Leslie Howard. Interpretação de grande delicadeza, um olhar para a câmera de quem sabe o que é uma câmera. Ela vinha da Suécia, onde havia começado um início de carreira teatral, logo interrompido por sua descoberta para o cinema. Gustav Molander, um dos melhores diretores pré-Bergman, a dirige em dois filmes: Intermezzo (a versão sueca que atraiu Selznick) e Destino. Na Suécia, fez pelo menos uns 10 filmes, cinco dirigidos por Molander, um na Alemanha (direção de Gustav Froelich) e depois Hollywood.

Gregory Ratoff a dirigiu na versão americana de Intermezzo e no sue filme posterior, Adão e seus quatro filhos, com Warner Baxter. Ratoff tinha feito carreira de ator e a combinação com Ingrid foi perfeita. Um começo certo na América.

Na Metro faz Gaslight, baseado numa peça de teatro que se viu no Brasil com Maria Sampaio e Rodolfo Mayer, no antigo Teatro Fênix (hoje edifício da Caixa Econômica Federal) e O médico e o monstro, Dr. Jeckyll e Mr. Hyde, versão de Spencer Tracy, inferior a John Barrymore e a de Frederic March (a melhor de todas) mas com a vantagem de ter no elenco Ingrid Bergman. Nesse filme, sua atuação como atriz não chega a ser importante, mas o papel lhe dá a possibilidade de mostrar a sensualidade de uma grande mulher, e quando isso acontece, de verdade, diante de uma câmera, algo importante está acontecendo. Falo especialmente da cena que ela conhece Dr. Jeckyll, médico, que ela tenta seduzir. Inesquecível a situação: ela está encantada com o médico e tenta seduzi-lo, conversa macia, cheia de dengos e um levantar de braços, colocando-os atrás da cabeça, revelando as axilas e mais que isso, deixando os seios bem livres, bem ao alcance de Dr. Jeckyll, que vê, mas se comporta. Eu sempre achei esse momento inesquecível, cheio de sensualidade, dos mais ricos e requintados realizados por uma atriz da qualidade de la Bergman.

Em 43, aconteceu Casablanca, de que em suas biografias publicadas ela sempre reclamou: “íamos para o estúdio sem saber o que íamos fazer, nos entregavam as cenas na hora”. É, mas em Casablanca se tornou o mito do cinema romântico e ela fez ao lado de Humphrey Bogart cenas sensuais marcantes, sempre ao som de “Play it again, Sam”. A melodia que ficou para sempre no ouvido de quem curte cinema.

Por quem os sinos dobram, baseado em Hemingway, não era um bom filme, mas prendia a gente na cadeira, por causa dela, e da Katina Paxinou, trágica grega deslocada do seu verdadeiro clima, mas uma atriz que nos obrigava parar para ouvi-la e vê-la em todos seus exageros (para a câmera de cinema)e seus destemperos.

Já em Saratoga Trunck, com Gary Cooper, Sam Wood deu a ela uma oportunidade de um papel pouco diferente e, bom diretor de atores, tirou dela o melhor.

Em Os sinos de Santa Maria, ela é escada para Bing Crosby, vestidinha de freira, papel meloso, sem maior significância. Na virada da esquina, ela encontra o gorducho Hitchcock, e com ele ganha dois importantes personagens: o da doutora apaixonada por Gregory Peck em Spellbound (no Brasil, Quando o coração fala) e ainda mais em Notorius, aqui Interlúdio, esse um excelente filme de suspense, em que ela, meio perdidinha, quase escorregando pela carreira mais antiga do mundo, se apaixona por Cary Grant. Ele, da contraespionagem, faz com que ela conquiste Claude Rain, nazista, em ação na América Latina, mais especificamente no Rio de Janeiro. Só ver Ingrid e Cary conversando num banco da Cinelândia já vale o filme, que era, além do mais, um suspense dos mais requintados. Ela não foi tão feliz em outro encontro com “Hitch”, ela simplesmente detestava takes longos, as sequências de 10 minutos que Hitchcock tinha experimentado em The Rope e queria repetir com Ingrid. Saiu de Sob o signo de Capricórnio  para ser Joana D’Arc, de Victor Flemming, onde estava linda, cheia de espiritualidade, uma Joana D’Arc mais do que verossímil, mas um filminho sem importância.

Aí aconteceu Rosselini. Ingrid foi uma das pessoas nesse mundo de Cristo que acreditou em Rosselini como um gênio. Ele não era. Tinha criado com Roma, cidade aberta, Paisa e Alemanha ano zero a fama de ser o criador do neo-realismo italiano e essa é merecida, mesmo que só mais tarde nas mãos de Visconti e Vitorio de Sica o neo-realismo alcançasse o apogeu em filmes como Ossessioni e Ladrões de bicicletas.

Mas Ingrid, na ânsia de criar obras-primas foi para a Itália e encontrou Rosselini. Um italiano que tinha no seu currículo amoroso Anna Magnani, caiu de amores por Ingrid e ela por ele. E foi um desastre. Desse tempo com Rosselini só Viagem à Europa se salva. Stromboli é no mínimo péssimo. Europa 51, so so. Rosselini dirigiu no teatro Joana D’Arc na fogueira, com música de Honneger, texto de Paul Claudel e nele Ingrid foi ótima.

Casamento desfeito, fez na Europa um bom Jean Renoir: Elena e os homens. Era um bom filme, onde o erotismo de Ingrid alcançava excelente resultado. Voltou para Hollywood, ganhou um Oscar por uma Anastácia sem maiores qualidades que a sua própria presença. Foi um pouco melhor no suspense Assassinato no Expresso Oriente e, afinal, Sonata de outono. Na mãe egoísta que nunca deixou que a carreira lhe desse espaço para olhar a filha carente de afetividade (Liv Ulmann), ela está nos seus melhores dias, digo até, para meu gosto, na sua melhor interpretação dos últimos tempos.

Para mim, a impressão final: Ingrid merecia uma carreira melhor, mas não vou esquecê-la nunca. Grande atriz, grande mulher, perfeita e imperfeita, por isso mesmo inesquecível.