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Melhor que o Éden


Sempre a mesma paixão, a desenvoltura da linguagem, a defesa permanente da mulher, essa Wanda que me parece, quase sempre, meio autobiográfica em tudo que escreve.  Podiam me pedir para fazer prefácio para tudo isso que li até ontem, ou melhor, até anteontem, porque há 2 meses tive o prazer de entrar em contato com o livro de contos As mil e uma grades. Uma presidiária reúne as companheiras e, como uma espécie de Sherazade, lhes narra histórias incríveis, algumas de puro terror, outras muito enigmáticas, algumas sem fim, algumas com vários fins à escolha do freguês, digo do leitor, ou digo melhor das presidiárias, companheiras dessa Sherazade brasileira tão vivida, tão consciente do que sabe (ou inventa), tão irônica nos seus raciocínios, tão realista no fim das noites, quando a história termina, com uma moral ou não, ela sempre deixa no ar alguma sabedoria, algum pensamento para tocar os ouvidos das desesperadas mulheres que a ouvem.

Eu podia ter sido convidado para prefaciar qualquer uma dessas obras – contos, romances, peças – eu acharia um convite meio óbvio, muito agradável porque eu saberia dizer do estilo da escritora Wanda Fabian, de sua construção dramática altamente elaborada, não fosse ela também uma hábil autora dramática, enfim, eu poderia esmiuçar essa Wanda que sendo contista, romancista e autora teatral, sabe usar seus conhecimentos em todos esses gêneros cada vez que começa uma nova obra. Em tudo que escreveu até agora eu sempre consigo reconhecer a contista/romancista e a autora de peças e mais peças, como que um inspirando a outra, uma fornecendo material/inspiração às outras.

Mas nada disso: resolveram me pedir para escrever o prefácio de Melhor que o Éden: aliás o novo romance devia se chamar Crime em Família, fato marcante na história, o romance que revela a autora: a personagem Marli, um pouco de Wanda Fabian, sem dúvida.

O feminismo, as frases cortantes em defesa da mulher são quase slogans da autora. Mas o que posso eu dizer desse Melhor que o Éden, a não ser que vivendo a Copacabana e a Tijuca de 1950, reconheço perfeitamente o tipo de vida que se levava nesses dois bairros, Copacabana com sua praia no auge da alegria, das festas, dos banhos à fantasia, dos concursos de miss (eu mesmo tive uma prima que ganhou Miss Pijama, é, isso mesmo, todas desfilavam de pijama e a Naná, esse era o nome da minha lindíssima prima, ganhou o Miss Pijama) e a Tijuca vivendo a sua vida mais recatada, mais burguesa, as distrações concentradas nos cinemas da Praça Saens Peña e na vida social/artística do Tijuca Tênis Clube. Copacabana e Tijuca de 50 estão no romance, são a necessidade da autora em se colocar num mundo em que viveu o melhor de sua juventude/mocidade.

Mas daí, a partir do romance Crime em Família da Marli, a nossa autora de verdade, a Wanda escreve um romance em que vale tudo, enfim, querendo resumir, eu diria que esse é um romance que vai de Alexandre Dumas Filho à Ágata Christie, a Hitchcock passando por M. Delly sem nenhuma tentativa de não deixar que a loucura domine a narrativa e o romance no seu todo.

Então não gostei do livro? Eu me perdi, não parei de ler, fiquei tonto, entusiasmado, não reconheci a Wanda, reconheci Wanda – você é louca? – em escrever isso?
Recuei algumas vezes, depois não pensei em mais nada, não critiquei mais nada e cheguei ao final, aliviado, com as soluções encontradas. Não sou a pessoa para fazer esse prefácio.

Só digo que não há quem possa resistir ao fascínio da Wanda Fabian, esse bicho de romance, uma Wanda que eu não conhecia, mas que nem por isso me divertiu menos.

Aconselho que leiam e enlouqueçam como eu.