Gosto de encontrar amigos e pessoas adoráveis no início de cada ano, armazenando as energias boas que essas reuniões provocam. Outra forma de me fortalecer a cada janeiro é reservar um tempo para abrir livros novos, passar os dedos sobre as folhas, sentir o perfume do volume recém-impresso. Estranhezas de leitor, alegrias que compartilho aqui, mostrando um pouco do que me acompanhará na rede, embalando este primeiro mês de 2016.
Livro que a gente joga pro lado sem se lembrar sequer do nome da mocinha só vale a pena em viagem de avião. Bom é aquele livro que revolta, que mexe com a cabeça da gente, que entusiasma e faz pensar. Ainda que o mercado continue investindo pesadamente na literatura de entretenimento – é indústria, não é fomento à cultura, não -, ainda que o ano tenha contabilizado o fim de uma editora importante, a Cosac Naify, e a junção da Companhia das Letras/Penguin com a Objetiva, publicou-se muita coisa boa além dos livros de colorir, dos romances e distopias para jovens adultos e obras de quem faz sucesso na Internet, seja por vídeos pessoais ou por divulgação de textos sobre amor - e sexo.
A poucas semanas do Natal, a editora Cosac Naify anunciou o encerramento de suas atividades, após vinte anos de publicações requintadíssimas. Tão requintadas que não combinavam com um negócio voltado para uma elite de leitores oferecendo produtos a preços muito acima do mercado - belos exemplares que darão interessantes presentes neste Natal, como Zazie no metrô (Cosac Naify, R$ 51), de Raymond Queneau. Lançado em 1959 e considerado um dos principais romances do século XX, este clássico da literatura francesa conta a visita da provinciana Zazie, de 12 anos, a Paris, durante uma greve de transportes. A edição em papel-bíblia, sobre fragmentos de imagens de cartazes da época, recria o ambiente que a personagem conhece durante seu passeio pela cidade.
A era da adolescência prolongada permite que o desfrutar de atividades infantis pelos adultos de hoje. Depois do sucesso estrondoso dos livros de colorir, que fizeram a alegria da indústria de lápis nos últimos tempos, é cada vez maior o número de publicações para serem rasgadas, anotadas, pintadas, customizadas pelo leitor. Um dos mais recentes é Roube como um artista – O diário – Um caderno de anotações para cleptomaníacos (Rocco, R$ 29,50), de Austin Kleon, cuja primeira sugestão é fazer uma lista de “dez coisas que quero aprender”. A segunda proposta é inventar legendas explicativas para um monte de triângulos e círculos. A terceira indicação é que o leitor vá a uma papelaria comprar uma caneta nova para testar na página seguinte.
Livros me arrebatam. Alguns tomam meu espírito e não consigo sossegar antes de terminar a leitura. Poucas horas me tomaram os contos de Antes que seque (Record, R$ ), da jornalista Marta Barcellos, que ganhou o Prêmio Sesc de Literatura 2015 com essa reunião de histórias sobre a vida contemporânea. A maioria dos 22 contos falam de mulheres, da maternidade almejada e construída, da maturidade, do envelhecimento, do empenho. Alguns têm homens como os protagonistas. Limitar as histórias a um gênero é reduzir as narrativas. Não são apenas questões femininas que Marta apresenta, mas um cenário social de limites, dificuldades e amarras às exigências tradicionais. Mães que veneram os filhos estão ao lado de mulheres totalmente despreparadas para criar ou proteger crianças, diante de um mundo que torna a função biológica uma carreira imposta a quem for fértil.
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